segunda-feira, 29 de março de 2010

A TC como forma de recordar a minha competência

A TC com crianças e adolescentes desta semana contou com 14 meninos e uma menina. Iniciamos com duas dinâmicas, a do pato, aprendi com a Perlucy e a do burrinho, com a Pedrita. Houve apenas um tema, sobre dificuldade de aprendizagem na escola, especificamente, português. O grupo todo estuda na rede pública e os pais não sabem ou não podem ensinar, cobrar e motivar seus filhos nos estudos.
A pergunta lançada para o grupo foi: "Quem já teve dificuldade em aprender algo e como conseguiu aprender?" Surgiram 4 falas, argumentando que: não desistiu e estudou, reconheceu que não sabia e pediu ajuda, esforçou-se estudando sozinho.
Reflexão: Quando, em uma TC o participante ouve que outras pessoas reconhecem suas dificuldades e que conseguiram vencê-las, acontece algo especial com aquele que ouve. O participante se identifica com a dificuldade, vê que todos temos dificuldades, relembra que já venceu algumas e se empodera para enfrentar os desafios pelos quais está passando. Assim, o participante passa a ver sua dificuldade como algo passível de ser superado. Ora, se eu e o meu colega vencemos uma dificuldade no passado, posso vencer a que estou vivenciando. A TC ajuda o participante a recordar e empoderar-se de suas competências: acreditar que é capaz.

quinta-feira, 25 de março de 2010

Dicas para TC com um grupo regular

As dinâmicas na TC são extremamente importantes para estimular as pessoas a falar e confiar no outro. Em um grupo que toda semana participam as mesmas pessoas fica complicado, pois tenho que ser muito criativa. UFA!
O que tenho feito para animar e dinamizar o grupo? Fiz o cronograma do ano, selecionei as datas comemorativas, como o dia do Trabalho. Nas TC próximas às datas comemorativas eu lanço o monte, por exemplo: O que você tem comemorar ou lamentar no dia do Trabalho? No Dia Internacional da Mulher. Perguntei que palavra te lembra mulher? Após todos falarem eu pedi para elas conte um momento de sua vida em que você foi guerreira (forte, mãe sedutora, corajosa, amorosa), os homens contaram de suas experiências com mulheres especiais.
Outra forma de fazer algo diferente é realizar uma dinâmica e ouvir como cada um se sentiu ao participar da dinâmica específica. Dicas: A dinâmica da cadeira solidária rendeu mais de uma hora de discussão. Você também pode contar uma história, um causo e lançar o mote coringa: Quem já viveu algo parecido e o que fez para solucionar? Atenção: a história deve ter relação com o grupo e para isso você deve conhecer bem as pessoas e o contexto social, econômico e cultural do grupo.

A TC como ponte entre o mundo real e o possível

A TC como espaço de reflexão social Na semana passada o tema da TC com os terceirizados voltou a ser sobre sofrimento no trabalho. "Estou indignada, porque nem no horário de almoço eu posso descançar...eles trancaram o vestiário, só abrem 15 minutos antes da saída, não posso nem pegar uma coisa na bolsa".
Hoje, uma semana depois, o tema continua. Eles estão indignados com a forma como são tratados no trabalho. Dizem: "me sinto como se eu não existisse", "tô me sentindo um lixo, um saco de lixo".
O tema de hoje trouxe a oportunidade de discutirmos sobre o mundo da terceirização, mais uma vez... Falamos que o sistema não vai mudar. Perguntamos: vc veio ao mundo a passeio? Qual o seu papel aqui? Por fim levantamos uma reflexão: O que estou fazendo com a minha vida? O que estou permindo que os outros façam com a minha vida?
A TC tem se revelado como um espaço para falar sibre o que incomoda cada participante, refletir sobre estes incômodos em grupo, cada um pode avaliar de forma crítica o seu comportamento na vida, no trabalho e na relação com o outro.A TC é uma ponte entre o participante e a possibilidade de uma vida melhor.

quarta-feira, 24 de março de 2010

A Terapia Comunitária com crianças e adolescentes - modelo de vínculo saudável

Um dos grupos de TC que participo é com meninos, de 8 a 18 anos, da periferia de Brasília. Percebo que em um ano e meio de roda os meninos mudaram a forma de se relacionar conosco. O modelo de vínculo que eles possuem é evitativo ou ambíguo. Por exemplo: um dos garotos do grupo apanha diariamente, está sempre na rua. Uma noite quando chegou em casa o padrasto disse: "hoje você não apanhou, ? Vem cá que vou te dar um abraço!" Quando o garoto se aproximou ele bateu com um pedaço de pau. O modelo de vínculo que estes garotos encontraram nos terapeutas e facilitadores do projeto é de segurança, respeito e confiança mútua. A constância do afeto na TC, o não julgamento e a acolhida sem censura, mas com firmeza, fez com que eles aprendessem a lidar com uma forma nova de se relacionar, de dar e receber outros afetos. A segurança no novo vínculo, com os adultos e entre si, abre uma nova possibilidade de relacionamento. Agora, eles possuem um modelo saudável de vínculo seguro e podem repetir este modelo com outras pessoas que conhecerem ao longo de suas vidas, professores, colegas e ingressar na sociedade com outro olhar. Graças à experiência de aceitação que vivenciaram na TC eles poderão ter a segurança de que podem ser aceitos na sociedade.

terça-feira, 23 de março de 2010

Meu problema são umas baratinhas que não querem morrer...


Um dia, em uma sessão, havia 32 participantes, eu perguntei quem tinha algum problema pra compartilhar, algo que está incomodando e precisa ser colocado pra fora. Silêncio total. Dava pra ouvir o coração da pessoa que estava ao meu lado. Eu insisti e insisti. Uma Senhora levantou a mão e disse: "eu tenho um problema que tá me tirando o sono, penso nisso o dia inteiro porque não encontro uma solução. Alguém aqui sabe me dizer que veneno mata umas baratinhas brancas, que não morrem por nada?
Eu, como terapeuta, pensei em sumir. E agora? Será que outra pessoa vai falar um problema mais interessante? Um problema psicológico, uma tragédia pessoal? Silêncio total. Será que hoje vamos falar sobre veneno de pra barata? Então eu lancei o mote: Quem aqui já teve uma praga em sua vida?
As respostas foram surpreendentes e emocionantes. Histórias de mulheres que foram perseguidas pelos maridos (pragas em suas vidas) e conseguiram fugir deles, mudando de cidade ou denunciando. Uma jovem disse que ela havia sido uma praga na vida de alguém: eu perseguia o cara...era louca por ele...não dava paz, nem pra ele e nem pra mim. Após muito sofrimento ela mudou-se para Brasília para evitá-lo.
A TC é assim, quando menos se espera as histórias e experiências de vida se revelam. Saber ampliar o tema, dar a ele um outro sentido, transitar do concreto para o abstrato é algo que temos aprendido nas rodas.

segunda-feira, 22 de março de 2010

ESCUTATÓRIA - Rubem Alves

Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular. Escutar é complicado e sutil. Diz Alberto Caeiro que 'não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. É preciso também não ter filosofia nenhuma'. Filosofia é um monte de idéias, dentro da cabeça, sobre como são as coisas. Para se ver, é preciso que a cabeça esteja vazia. Parafraseio o Alberto Caeiro: 'Não é bastante ter ouvidos para ouvir o que é dito; é preciso também que haja silêncio dentro da alma'. Daí a dificuldade: a gente não agüenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor, sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer. Como se aquilo que ele diz não fosse digno de descansada consideração e precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer, que é muito melhor. Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil de nossa arrogância e vaidade: no fundo, somos os mais bonitos... Tenho um velho amigo, Jovelino, que se mudou para os Estados Unidos estimulado pela revolução de 64. Contou-me de sua experiência com os índios. Reunidos os participantes, ninguém fala. Há um longo, longo silêncio. Todos em silêncio, à espera do pensamento essencial. Aí, de repente, alguém fala. Curto. Todos ouvem. Terminada a fala, novo silêncio. Falar logo em seguida seria um grande desrespeito, pois o outro falou os seus pensamentos, pensamentos que ele julgava essenciais. São-me estranhos. É preciso tempo para entender o que o outro falou. Se eu falar logo a seguir, são duas as possibilidades. Primeira: 'Fiquei em silêncio só por delicadeza. Na verdade, não ouvi o que você falou. Enquanto você falava, eu pensava nas coisas que iria falar quando você terminasse sua (tola) fala. Falo como se você não tivesse falado'. Segunda: 'Ouvi o que você falou. Mas isso que você falou como novidade eu já pensei há muito tempo. É coisa velha para mim. Tanto que nem preciso pensar sobre o que você falou'. Em ambos os casos, estou chamando o outro de tolo. O que é pior que uma bofetada. O longo silêncio quer dizer: 'Estou ponderando cuidadosamente tudo aquilo que você falou'. E assim vai a reunião. Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de pensamentos. E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir coisas que não ouvia. (Os pianistas, antes de iniciar o concerto, diante do piano, ficam assentados em silêncio,[...]. Abrindo vazios de silêncio. Expulsando todas as idéias estranhas). Eu comecei a ouvir. Fernando Pessoa conhecia a experiência, e se referia a algo que se ouve nos interstícios das palavras, no lugar onde não há palavras. A música acontece no silêncio. A alma é uma catedral submersa. No fundo do mar - quem faz mergulho sabe - a boca fica fechada. Somos todos olhos e ouvidos. Aí, livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia, ouvimos a melodia que não havia, que de tão linda nos faz chorar. Para mim, Deus é isto: a beleza que se ouve no silêncio. Daí a importância de saber ouvir os outros: a beleza mora lá também. Comunhão é quando a beleza do outro e a beleza da gente se juntam num contraponto.

A Terapia Comunitária e a terceirização

A terceirização pode ser definida "o ato de transferir a responsabilidade de um serviço, ou de determinada fase da produção ou comercialização, de uma empresa para outra“ (Repullo, 1997). O trabalho, para a psicodinâmica, “faz parte da constituição da subjetividade do sujeito, implicando em ação do sujeito sobre a realidade, sendo o real o que se faz reconhecer pelo sujeito” (Dejours, 2007). O autor considera que vivenciando o sofrimento o trabalhador pode desejar vencê-lo, ressignificá-lo, transformá-lo. Para a psicodinâmica as vias da transformação são: o uso da palavra e a mobilização dos trabalhadores. A Terapia Comunitária atua, inicialmente, como via de transformação com o uso da palavra. A TC no ambiente de trabalho cria um espaço para que a fala circule e os trabalhadores possam encontrar, na fala, uma via para ressignificar o sofrimento, viabilizando a mobilização dos trabalhadores. Em função do sofrimento no trabalho percebe-se danos psicológicos, como: tristeza, sensação de abandono/desamparo, baixa auto-estima, desesperança e conformismo. O objetivo deste trabalho é discutir os sofrimentos vivenciados pelos trabalhadores que participam com regularidade de um grupo de Terapia Comunitária – TC no ambiente de trabalho. O texto faz uma articulação entre os conceitos da Psicodinâmica do Trabalho e a TC. Apresentando a TC como via de transformação do sofrimento no trabalho.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Terapia Comunitária no ambiente de trabalho

Os participantes desta roda de TC que realizo são trabalhadores terceirizados da área de conservação e limpeza, responsáveis pela manutenção da limpeza em dois prédios de 6 andares cada um. Ao todo são 183 terceirizados de manutenção e conservação, com jornada de 44 horas semanais, trabalhando inclusive aos sábados. O grupo de trabalhadores que participa da roda é formado por mulheres (em maior número) e homens que ganham um salário mínimo e moram em cidades satélites e Entorno, região do Goiás próxima ao Distrito Federal. Quanto à carga de trabalho, além das 8 horas, estes trabalhadores moram longe e em função da natureza do trabalho são obrigados a ficar em pé grande parte do tempo, acarretando problemas de saúde como dores nas pernas e problemas de circulação. Alguns pegam peso em demasia, o que leva a problemas ortopédicos, como coluna e outros. Pelo fato de não terem estabilidade no emprego, eles podem ser demitidos ou transferidos a qualquer momento. Em função disso o grupo está sempre com novos participantes, apesar de existir participantes que nunca faltam, muitos saíram e novos estão sempre chegando. Percebemos que o discurso dos novatos, nos primeiros encontros, também é de negação do sofrimento: “só tenho a agradecer, não tenho nenhum problema” ou “fiquei preocupada em vir para este prédio, onde eu não conhecia ninguém, mas tudo que Deus faz é pro meu bem”. Para a Psicodinâmica do Trabalho o trabalhador deve reconhecer o sofrimento, para vivenciá-lo e assim transformá-lo em prazer. A luta contra o sofrimento pode se dá de maneira individual e coletiva. Essa luta caracteriza-se pelo ocultamento ou identificação do sofrimento, sob a forma de patologia, ou enfrentamento efetivo de causas enraizadas na situação de trabalho. (Dejours, 1994). O autor aborda algo que é um dos princípios da TC comunitária: o que não falamos com a boca pode se manifestar através de doenças/patologias. A TC age como prevenção primária (OMS), que compreende todos os atos destinados a diminuir a incidência de uma doença em uma população para reduzir os riscos de aparição de novos casos. A capacidade de transformar o sofrimento em prazer é o que na TC chamamos de resiliência. Na TC nós não buscamos diagnosticar os problemas, queremos sim: Identificar e suscitar as forças e as capacidades dos indivíduos, das famílias e das comunidades para que, através desses recursos, possam encontrar as suas próprias soluções e superar as dificuldades impostas pelo meio e pela sociedade (Barreto, 2008, p. 32) Hoje, muitos sofrimentos são reconhecidos e trazidos para a roda. Uma das questões trazidas pelos participantes é que eles se sentem engessados pelas normas do trabalho, que eles definem como inflexível, com quase nenhuma autonomia. A Psicodinâmica doTrabalho considera que a organização do trabalho é saudável quando oferece oportunidades para negociação, ou seja, quando há uma certa liberdade para o trabalhador ajustar a realidade de trabalho aos seus desejos (Mendes, 2008). Ou seja, um trabalho saudável é aquele que é flexível, que permite ao trabalhador ser criativo.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Terapia Comunitária

A Terapia Comunitária – TC está fundamentada em cinco pilares: Pensamento sistêmico, teoria da comunicação, antropologia cultural, pedagogia de Paulo Freire e capacidade de resiliência do ser humano. A TC é um procedimento terapêutico, que pode ser realizado com qualquer número de pessoas, em qualquer nível socioeconômico, com a finalidade de promover a saúde e a atenção primária em saúde mental. Funciona como fomentadora de cidadania, de redes sociais solidárias e de identidade cultural das comunidades. Por ser um trabalho em grupo, atinge um grande número de pessoas, abrangendo questões individuais, familiares, institucionais e sociais. Alguns objetivos da Terapia Comunitária merecem ser lembrados no contexto do trabalho: redescobrir e reforçar a confiança em cada indivíduo diante de sua capacidade de evoluir e de se desenvolver como pessoa; reforçar a auto-estima individual e coletiva; reforçar a dinâmica interna de cada indivíduo promovendo as potencialidades e a autonomia (Barreto, 2008).