domingo, 21 de outubro de 2012

Quando o pai não é o herói...


Na roda anterior de Terapia Comunitária, uma participante apresentou sua história: a busca por sua mãe que a havia deixado com a mãe adotiva. Ela localizou a mãe, morta em outubro passado. Hoje ela traz a questão do seu filho que não possui o nome do pai no registro. Agora a escola a orienta a buscar o pai do garoto. Ela está desanimada, cansada e não quer fazer isso, porque não considera relevante.
No grupo ela pode ver como é importante o nome do pai no registro de uma pessoa. Vários participantes contaram como se sentiram crescendo sem o nome do pai, enquanto outras contaram como foi complicado provar ou convencer o pai de seus filhos a registrá-los e pagarem a pensão devida.
É comum na nossa cultura valorizarmos o papel da mãe em detrimento do pai. Muitas vezes são as próprias mães que desprezam o valor do pai diante do filho. Estamos em uma época em que, no meu entendimento, começamos a dar ao pai o lugar que ele merece em nossas vidas.
Estudos recentes têm buscado entender o papel do pai desde a gestação. Qual o lugar do pai na vida de um recém-nascido? Muitas vezes ele serve apenas para carregar a bolsa ou o carrinho do bebê. Mas isso não é verdade. O pai é muito importante na vida de uma pessoa.
Assim, esta jovem pode ver sua questão de outra forma. Pode entender que é importante para o seu filho saber quem é seu pai e ser reconhecido por este. Ainda que falte o essencial: o envolvimento afetivo entre pai e filho.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Sobre o viver e o morrer (Sêneca)



Nos últimos dias tenho lido Sêneca, um filósofo contemporâneo de Jesus Cristo. Como outros estoicos, ele ensinava que as emoções destrutivas resultavam de erros de julgamento. Ele escreve sobre a duração da vida, a morte e a velocidade do tempo. Um tema constantemente trazido nas rodas de terapia que realizo é a questão da morte e como lidar, suportar, conviver e aceitá-la.
De acordo com este autor o que nos distingue um dos outros é apenas o intervalo entre o nascimento e a morte. Não cabe muita coisa na duração da vida, argumenta o pensador. Quando pensamos assim trazemos a morte presente à nossa consciência (destaco que a sua presença é constante, independentemente de a reconhecermos). Quando assim o fazemos não nos desanimamos para a vida, ao contrário: “nada do que me acontecer receberei com tristeza” diz o filósofo.

Qual vida tem mais valor? A daquele que vive pouco ou a do que vive muito? Para Sêneca o que nos diferencia uns dos outros é a sabedoria. Ora, sabedoria não é cultura, educação, formação; é aceitação da finitude, da vida e da morte. Fácil falar, difícil de viver!
Em outro momento Sêneca considera que “o que importa é quão bem tu vivas e não quão longamente, e muitas vezes o bem-viver está nisso, em não viver longamente”. Para este pensador viver bem é alimentar a alma, não o corpo. Será que nossa geração tem vivido bem? Ou será que só nos preocupamos em ter um corpo lindo, uma roupa de marca, uma tecnologia de ponta? Diga-me qual é o seu viver, antes que morramos...aceitar a morte me leva a viver a vida com mais sabor e intensidade!

sábado, 6 de outubro de 2012

Filha abandonada pela mãe é exemplo de resiliência

A nossa roda de ontem foi marcada pela falta, a saudade. Uma participante nos contou que após 23 anos resolveu procurar sua mãe biológica. Ela fora deixada, aos 3 anos, com a dona de um hotel em um garimpo do nosso país, a mãe disse que voltaria, mas nunca veio buscá-la.
Esta semana amigos encontraram sua mãe, que faleceu em outubro passado, aos 41 anos. A jovem se considera feliz por saber notícias, mas que lamenta não poder abraçar e beijar a tão desejada mãe. Perguntei quais sentimentos ela tinha em relação ao abandono. Pra surpresa de todos, ela relata não se sentir abandonada, considera que sua mãe a deixou porque queria protegê-la do padrasto que não gostava dela (ele chegou a queimá-la com cigarro). “Foi bom pra mim ter ficado com minha mãe adotiva, ela me amou muito e a outra também”.
A capacidade de resiliência desta moça nos deixou encantados. Quantas vezes nós enfatizamos o que faltou e não o que nos foi oferecido pela vida? Ser capaz de superar as faltas, agradecendo pelo que recebemos, é uma capacidade que todos temos, uns mais outros menos. A falta é constituinte do ser, é a partir da falta que nos tornamos quem somos, a falta é o espaço no qual nos constituímos. Entendo que com boa vontade e conscientização podemos, como esta participante, ver o que o vazio nos oportunizou, nos viabilizou outros crescimentos.
Ao final, fizemos uma rodada onde todos tivemos a oportunidade de verbalizar o que nos faltou. Sugiram temas com o pai sempre ausente e indiferente, o carinho da mãe que partiu deixando a filha ainda criança, o pai que faleceu, a irmã que sumiu no mundo há 30 anos, a família que ficou no nordeste, a bicicleta que nunca ganhou, a irmã que nasceu morta, o filho que não veio, o pai que não assumiu a paternidade...
Por fim, convidei a todos que refletissem sobre o que tais faltas fizeram com eles: “O fato de ter saudade/falta dessas pessoas, afetos e coisas fez o que de você?” E você leitor? Já olhou a sua falta com resiliência? O que faltou pode ter feito de você uma pessoa melhor? Certamente podemos ver nossa história de outro ponto de vista. Lembrando que “cada ponto de vista é a vista de um ponto” (Leonardo Boff, em A água e a galinha).