terça-feira, 14 de agosto de 2012

Ok, eu sofri, e agora o que eu faço com tudo isso?

Sexta passada a Fátima, terapeuta, trouxe um mote fechado. Em comemoração ao dia dos pais ela perguntou: Qual a influencia de seu pai na sua vida, na sua formação? Neste dia todas as participantes eram mulheres. Uma delas iniciou: “eu só tive influencias negativas...eu tinha sete anos quando meu pai nos abandonou, fugiu com a vizinha. Ele deixou minha mãe grávida, com um filho de dois anos e eu. Logo que o bebê nasceu ela foi trabalhar e eu cuidava dos dois meninos, fazia comida e limpava a casa. Não tive infância!”
Em casos como este, em que a pessoa relata profunda mágoa é importante que o terapeuta tente tirar o foco do sofrimento, da dor, ajudar a pessoa a encontrar algo positivo para ressignificar sua história e se empoderar. Acredito que quando crianças somos vítimas de nossos pais, mas quando nos tornamos adultos podemos deixar de ser vítima e transformar a dor, tomar as rédeas de nossa vida. É como se eu dissesse: Ok, eu sofri, e agora o que eu vou fazer com tudo isso?


Então, perguntei o que ela aprendeu com o abandono. Ela disse que não aprendeu nada. Perguntei de outro modo: o que há de positivo em você que tem alguma relação com o fato de o seu pai ter faltado? Ela disse: não entendo a sua pergunta. Pela terceira vez eu perguntei, com outras palavras: em que a falta do seu pai contribuiu pra você ser a pessoa que você é hoje? Ela permaneceu calada. Outra pessoa falou: “você disse que é uma mulher forte, esta força tem alguma relação com a sua infância?” A jovem respondeu com ar de surpresa: sim, é verdade, eu sou forte e posso sustentar minhas três filhas sozinha (como minha mãe) porque eu tive que ser forte muito cedo.
Este é um exemplo de como descobrir a pérola em meio à dor, e também ilustra como funciona uma roda de TCI, de forma extremamente resumida. Destaco que esta mágoa e falta de perdão precisam ser trabalhadas, considero importante uma terapia individual. Na próxima postagem apresentarei a história que outra pessoa trouxe no momento da partilha, ela viveu algo parecido e superou o abandono.

2 comentários:

  1. Adorei o post. :D
    Dália Matsinhe

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  2. Um pai de presente - Susanna Lira - Revista O GLOBO - 12 de agosto de 2012

    Tenho na memória a imagem nítida: eu na escola pintando com guache a gravata de papel que mais tarde ficaria esquecida em algum canto da minha gaveta. Eu não tinha para quem entregar, mas não ia jogar fora o empenho que havia dedicado ao meu trabalho da arte. Nunca foi um drama e até por isso ao longo de anos a figura desse pai que não sei nem o nome e nem o rosto ficou esquecida na estante das "coisas que não são tão importantes".Há sete anos, fui questionada pela minha filha, Pilar: "Mãe, quem é o meu avô?"Sem resposta e sem graça, fui tentar explicar a ela por que alguna homens assumem a paternidade. Ela, na época com 8 anos, não se convenceu com meus argumentos. E eu, que desde cedo já mostrava certa habilidade para as artes, fui dedicar o mesmo empenho da criança que pintava a gravata sem dono para, através de outro tipo de arte, entender a ausência paterna. Desde então embarquei em uma viagem por dezenas de cidades brasileiras filmando histórias, ouvindo pessoas e indo ao encontro de minhas inquietudes.


    Nasci e vivo num modelo do que hoje se classifica como "nova família". Acredito que pessoas são completamente viáveis em qualquer modelo de estrutura familiar. Mas nesse movimento moderno e crescente, quero sugerir e desejar a inclusão de novos papéis familiares e não a exclusão de outros. Ser humano precisa de afeto e atenção, e pai, quando existe, é importante, sim! Compromisso e responsabilidade com os filhos nos tornam mais fortes como cidadãos, mas dar carinho e apoio e ser leal à paternidade nos tornam seres humanos melhores, criamos em nosso entorno uma sociedade mais igualitária.

    O Brasil vive uma epidemia de pais ausentes. Os movimentos sociais e a justiça se articulam em campanhas para trazer de volta à família a figura do pai. Muitas vezes a paternidade é tratada como um caso de Justiça ou apenas um mero acerto financeiro. Mas eu, como filha que cresci e sobrevivi sem meu pai, penso que esse pai deve ser convidado amorosamente para esse retorno. As histórias de pais e filhos são, acima de tudo, histórias de amor que precisam e devem ser vividas. Além de todas as responsabilidades jurídicas e financeiras, ter pai e ser pai é bom por inúmeras razões. Ao longo desses anos de pesquisa, ouvi relatos peculiares. Uma vez, em Porto Alegre, um menino me disse que queria ter um pai para jogar bola com ele. Outra vez, em Salvador, uma menina queria o pai porque as amiguinhas tinham e ela não. Mas o caso que mais me chamou a atenção e com o qual secretamente me identifiquei foi o de um porteiro em Brasília. Ele queria um pai para poder chamar alguém de pai. E como não tinha essa pessoa, chamava o filho de 7 anos de pai. Ele era um homem enorme, e o filho muito franzino. E vê-lo chamar o filho dessa forma soava um tanto estranho. Ninguém consegue expliacr esntimentos, mas se hoje alguém te chamar de pai, retribua com um abraço. Você ocupa um papel muito importante na vida dessa pessoa. Se puder, nunca delegue essa função a ninguém. Do seu jeito, da forma que puder, SEJA PAI. Assim, contribuiremos para que futuramente tenhamos mais dias de paz(is).

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