sábado, 8 de outubro de 2011

Omelete de amoras: melancolia, saudades do impossível!


Era uma vez um rei que tinha todos os poderes e tesouros da terra, mas, apesar disso, não se sentia feliz e, a cada ano, ficava mais melancólico.Um dia, ele chamou o seu cozinheiro e disse-lhe: Você tem cozinhado muito bem para mim e tem trazido para a minha mesa as melhores iguarias, de modo que lhe sou agradecido. Agora, porém, quero que você me dê uma última prova de sua arte. Você deve me preparar uma omelete de amoras igual àquela que comi há 50 anos, na infância. Naquele tempo, meu pai tinha perdido a guerra contra o reino vizinho e nós precisávamos fugir. Viajamos dia e noite através da floresta, onde, afinal, acabamos nos perdendo. Estávamos famintos e cansadíssimos, quando chegamos a uma cabana onde morava uma velhinha, que nos acolheu generosamente. Ela preparou-nos uma omelete de amoras, e, quando a comi, fiquei maravilhado. A omelete era deliciosa e me trouxe esperança ao coração. Na época, eu não dei muita importância à coisa. Mais tarde, já no trono, vasculhei todo o reino, porém não foi possível localizá-la. Agora, quero que você atenda a esse meu desejo: faça uma omelete de amoras igual à dela. Se você conseguir, eu lhe darei ouro. Se não conseguir, entretanto, mandarei matá-lo.
Então, o cozinheiro disse: Senhor, pode chamar imediatamente o carrasco. É claro que conheço todo o segredo da preparação de uma omelete de amoras, sei empregar todos os temperos, conheço as palavras mágicas que devem ser pronunciadas enquanto os ovos são batidos e a melhor técnica para batê-los, mas isso não me impedirá de ser executado, porque a minha omelete jamais será igual à da velhinha. Ela não terá o sabor picante do perigo, a emoção da fuga, não será comida com o sentido alerta do perseguido, não terá a doçura inesperada da hospitalidade calorosa e do repouso. Não terá o sabor do presente estranho e do futuro incerto.
Esta história nos faz pensar que a melancolia é, como escreve Freud, uma sensação de que se perdeu algo, que não se sabe bem o que. Em consequência disso passamos dias de nossas vidas tentando trazer de volta o sabor de uma omelete única. O rei da história estava melancólico, sem vigor, com saudades de um tempo especial de aventura, amor, emoção, magia (acho que a velha era uma feiticeira). Porém, ele ficou preso ao passado, sem viver o presente, pensando que se consumisse a omelete, matando se preciso fosse, ele teria sua alegria de volta. É impossível revivermos momentos especiais do passado.
Hoje confundimos objeto de desejo com objeto de consumo. As crianças desejam um brinquedo novo, os jovens uma roupa nova, os adultos uma viagem nova e os mais vividos um corpo novo ou o antigo. O desejo é inerente a nossa existência humana, não podemos possuí-lo, consumi-lo. O desejo é vital, o consumo não. É comum as pessoas dizerem que vão às compras, porque estão tristes. Triste engano, as compras nunca poderão preencher o vazio, ou trazer de volta algo que passou.
Lembrando Titãs: Você tem fome de que? Sempre quer inteiro e não pela metade? Necessidade, desejo... Não confunda necessidade com vontade! O que fazer então? Promover novos momentos especiais: fazer novos pratos, com novos sabores, com novas magias. Faça algo novo, ria, chore, ame, brigue, faça as pazes, viva. Agradeça pelo que você tem!
Parábola extraída do livro AS MAIS BELAS PARÁBOLAS DE TODOS OS TEMPOS - Volume 2, Alexandre Rangel, Editora Leitura

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