quinta-feira, 24 de maio de 2012

O STF não criou uma terceira exceção ao aborto

O Brasil é um país fortemente influenciado por valores cristãos. Nota-se isto no papel central que a maternidade ocupa na sociedade e no fato de o aborto provocado, um problema de saúde pública, ainda causar tanta comoção popular. Quero aqui, apenas discutir a questão do anencéfalo no contexto da sociedade brasileira.No Código Penal Brasileiro (DECRETO-LEI Nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940) há duas exceções para realização de aborto: quando a gravidez oferece risco de vida para a mãe ou quando o feto em gestação é resultado de estupro, mesmo sendo o feto viável, potencialmente uma vida saudável. Porém, mesmo quando o feto não tem esperança de sobrevida após o nascimento, como o anencéfalo, a lei não permite a realização de aborto. Para exemplificar sobre a postura da sociedade em relação ao aborto, lembro a recente polêmica nacional em torno da “antecipação do parto” de feto com anencefalia (má formação rara, caracterizada pela ausência parcial do encéfalo da calota craniana, nas primeiras semanas da formação embrionária). Em abril deste ano o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que não caracteriza crime de aborto tipificado no Código Penal a mulher que decide pela “antecipação do parto” em caso de gravidez de feto anencéfalo. O STF não legislou acerca do aborto, legislar é competência do Congresso Nacional, não criou uma terceira exceção para o aborto. A Corte atentou não para o início da vida, mas para sua potencialidade. No caso de fetos com anencefalia, sabe-se que não há, potencialmente, possibilidade de vida após o nascimento. Sob esse ângulo, a curetagem de um feto anencéfalo deixa de ser um aborto, no sentido jurídico da expressão. Se não há possibilidade de concretização da vida, não há crime contra a vida, portanto, não é aborto.Independente da expressão, antecipação do parto ou aborto, a decisão causou grande comoção popular. Religiosos ou não se manifestaram a favor da vida, não levando em conta o sofrimento psíquico da mulher que carrega um filho potencialmente morto no ventre, semelhante ao natimorto. Este fato ilustra que a maternidade ainda é considerada um dom. Tendo a mulher que se submeter a qualquer sacrifício em função de um filho. O que está de acordo com a afirmação de Badinter (1985) de que a maternidade é influenciada e sacralizada pela cultura cristã ocidental. 

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