domingo, 4 de março de 2012

Gravidez e relações arcaicas

Estou em férias do trabalho (do oficial), então resolvi retomar o trabalho com o grupo de grávidas no Hospital Universitário de Brasília (HUB). Hoje 7 e 30 da manhã estávamos chegando (eu e Valéria) à sala de atendimento para gestantes de alto-risco. Oferecemos nossa escuta e algumas grávidas vieram até nós para compartilhar conosco suas angústias, medos, fantasmas, ambivalências e, é claro, alegrias e esperanças. Destaco que não realizamos uma terapia comunitária.
Compartilho apenas um caso. Ana (nome fictício) está grávida de 5 meses de uma menina, ela é solteira, que teve um primeiro filho que veio a óbito aos 2 anos de idade por problemas respiratórios. Esse filho rejeitou o peito, cheio de leite, aos dois meses de idade. Parece que faltou algo na relação desta mãe com este filho. Disse ela: “Ele perdia peso facilmente e estava sempre doente”. Para Winnicott uma alimentação bem sucedida e o desmame retratam o bebê que experimentou um sentimento de onipotência no decorrer da fase de dependência absoluta da mãe, quando ela era capaz de adaptar-se às suas necessidades (Preocupação materna primária, Winnicott, 1956). Artigo sobre o tema.
Hipertensão gestacional algo comum
Chamou-me a atenção o fato de esta mulher dizer: “tem que nascer logo, na barriga dá muito trabalho”. Parece que a humanidade inteira pensa diferente dela. No desenvolver de sua fala descobrimos que ela possui pressão alta (hipertensão gestacional) teve que excluir vários alimentos e atualmente dorme muito mal, devido a um problema na coluna.  Sua gestação não é nada confortável. Ao investigarmos sobre a gestação de sua mãe, Ana nos conta que ela nasceu de sete meses e ficou na incubadora por dois meses. A mãe foi para casa e ela ficou quase dois meses sozinha no hospital.
Parece que faltou algo na relação (primitiva) de Ana com sua mãe. Algo nas relações arcaicas permanece quebrado. Como diria Melanie Klein: Haverá sempre a tentativa de reconstruir o objeto interno danificado. O que aconteceria em alguns casos é que esta falha não permitiria uma livre aceitação da maternidade, durante e após a gestação. Na tentativa de reconstruir o que foi danificado a mulher revive, desde a gestação, seus traumas inconscientes, marcas deixadas no bebê que ela fora, antes do desenvolvimento da linguagem. O desejo de restaurar as relações que foram danificadas com o outro, a começar pela mãe, promoveria o reviver de traumas arcaicos. A ideia de M. Klein é bastante complexa, não é possível explicá-la em um parágrafo.
Para saber mais: Amor, culpa e reparação Obras completas de Melanie Klein, v. 1. Imago, 1991.
A psicanálise de crianças - Obras completas de Melanie Klein, v. 2. Imago, 1997. 

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